Autor: Vinicius Machado
Técnica: Lápis 6B e aquarela
Cinco notas sobre autorretrato:
1. Frequentemente olho pra mim, nem sempre com intenção. Todo dia de manhã, por exemplo, saio de casa e encaro minha imagem sonolenta na meia dúzia de espelhos do elevador do prédio. Quatro longos andares observando o cabelo, a barba, a roupa. É no elevador onde, geralmente, descubro o que está escrito nas estampas das camisas que uso. Em casa mesmo, evito os espelhos. Eu (ainda) não me seduzo.2. Fico pensando no triste destino de Narciso, enfeitiçado, que perdeu toda a vida admirando a própria imagem; de todas as coisas maravilhosas do mundo, ficou na conclusão de que era a mais perfeita e a única digna de apaixonar-se. Tem muita síndrome de Narciso por aí: na internet, nos perfis anônimos; na mais alta diretoria até o mais iniciante dos estagiários da empresa; nas academias (local de práticas desportivas ou lúdicas) e nas academias (agremiação científica, literária e artística); no Big Brother e nos programas de domingo (a gente se vê por aqui); em qualquer frestinha que revele um oásis da autoimagem. Todos os meios possíveis de fazer um autorretrato na melhor pose e dizer que a melhor pose é o mais sincero dos autorretratos.3. Humberto Gessinger costuma dizer que “quando alguém diz que este ou aquele é meu melhor ou pior disco, livro, música, banda, está dizendo mais sobre si mesmo do que sobre meus discos, livros, músicas ou bandas...”. Acho que fazemos autorretrato o tempo inteiro.4. Também buscamos (ou encontramos sem buscar) espelhos em pessoas e objetos. Irmãos, pais, homens e mulheres, amigos e inimigos. Uma caixa de lápis de cor. O Best-seller de autoajuda (ver-se colocado em problemas e questões semelhantes pressupõe a ideia de que as soluções também o são. Pode até ser; dependendo da qualidade da autoajuda, acho que é possível). Casos como os da Scarlett Johansson ou Carolina Dieckman devem ser (com o perdão do trocadilho) reflexos da busca geral por conhecer o olhar do outro. Queremos ver como somos vistos. Ou, em última análise, ver como nos vemos.5. Na dúvida, sempre que me pedem um ‘eu’ isento das armadilhas de um autorretrato, entrego minha 3x4. Em documentos e repartições, números e papéis, parece adequado um ‘eu’ sem fotogenia, sem pose, sem arte (ou pelo menos algo bem próximo a isso). Serve para me reconhecer, embora eu mesmo quase não esteja lá.
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